Por Marisa Sevilha Rodrigues (*)
Quando a notícia estourou, na última sexta-feira, 12/08, na imprensa e redes sociais, foi um Deus nos acuda. Monja Coen vai ser marca de cerveja? Ela vendeu o seu nome para a Ambev? Mas como assim, desde quando budismo e consumo de bebidas alcoólicas combinam? Que loucura é essa? E as perguntas não paravam por aí. Eu, particularmente, assim que soube da informação, achei o máximo. Um super golaço de publicidade, de branding, dos estrategistas de construção de marca e por aí afora. Aí, é claro, fui ler tudo o que os especialistas em comunicação estavam dizendo, e vi que a maioria estava se posicionando contra, achando que a Monja tinha vendido a alma para o diabo e coisas do gênero. Afinal, diziam, ela é uma MONJA que fêz carreira no monastério, ou melhor, fora dele, pregando a moderação, os limites, a contenção dos prazeres fugazes em troca de uma vida mais equilibrada, mais harmônica e em consonância com os preceitos do zen-budismo, no qual ela fêz toda sua formação como religiosa.
O engraçado foi que por mais que eu lesse opiniões contrárias, cada vez mais me convencia que sim, a parceria entre ela ou a marca Monja Coen – que já precisamos dissociar da pessoa da monja – e a Ambev me pareciam fazer todo o sentido. E o fazem. Senão, vejamos: perfeitamente antenada com a as exigências e as buscas dos consumidores por uma vida mais plena, mais cheia de sentidos, seria fatal que mais dia ou menos dia, os executivos de marketing estratégico da empresa iriam questionar o consumo exagerado de cervejas. Um estudo recente feito pela Opas (Organização Pan-Americana da Saúde) em 33 países da América Latina mostrou que os brasileiros foram os que mais beberam desde a chegada da onda viral. Os dados mostram que 74% deles beberam durante a pandemia e aumentaram a quantidade e a frequência de consumo das bebidas alcoólicas. Superamos a média mundial. Hoje, por aqui, o consumo médio anual é 8,9 litros — o que nos deixa na 49ºposição entre os maiores bebedores DO MUNDO!!!Alguém contrapôs essa versão, dizendo que a Ambev estimulou com campanhas publicitárias esse consumo, se aproveitando, portanto, de uma fragilidade do consumidor, fechado em casa, isolado, deprimido, muitos já desempregados, ou seja, totalmente vulneráveis, no que concordamos, plenamente. Porém, qual poderia ter sido a reação da Ambev? Fazer campanhas mais deprimentes ainda? Pedir para que todos chorassem e rezassem? Conclamar as pessoas todas para entrarem para um mosteiro, talvez? A marca fêz o que estava no seu DNA que é vender cerveja, seja em que circunstância fôr. Mesmo correndo o risco de aumentar perigosamente o consumo, ela encontrou uma maneira de incentivar os brasileiros a manterem o isolamento de um jeito minimamente alegre. Do tipo: dos males, o menor: já que não podemos ir para as ruas, vamos fazer churrascos em casa mesmo e, de quebra, tomar uma cervejinha que ninguém é de ferro. Pegou mal? Para os intelectuais maledicentes e mal-humorados, talvez sim. Eu não fiz nenhum churrasco durante a pandemia e gostaria muito de tê-lo feito, mas não fiz porquê não tenho laje nem varanda gourmet no meu apê. Aiii, odeio esse falso moralismo.
Mas o interessante dessa estória é perceber os movimentos da empresa, em busca do zeitgeist – espírito do tempo – norteando seu trabalho de marketing e comunicação paraa direção, pregada pela Monja. Passado o auge da pandemia, com as pessoas cada vez mais vacinadas e voltando ao mercado de trabalho, e à vida normal, dentro do possível, depois de tudo o que sofremos e passamos nesses 18 meses desde que o Coronavírus aportou no Brasil, a Ambev sabe que agora é hora de tomarmos todo o cuidado com possíveis contágios entre os que ainda não se vacinaram, entre os mais jovens, que ocupam a faixa de maior consumidores de cerveja, de se continuar usando máscaras, álcool em gel, enfim, de manter todos os cuidados profiláticos que nos foram ensinados no início da pandemia. Eis um momento que deve ser levado a sério, por toda a população, incluindo os que amam cerveja e/ou outras bebidas alcoólicas. É um momento que exige, mais do que nunca, MODERAÇÃO, sim, para pensarmos antes de sair fazendo besteiras por aí, pois as consequências podem ser muito graves. Beber e dirigir, por exemplo, pode nos levar à morte,
Foi aí que algum gênio de marketing da Ambev lembrou da Monja Coen, famosérrima por seus milhões de seguidores no Youtube e Instagran, pelos inúmeros livros de aujo-ajuda que publicou, e por suas palestras cada vez mais disputadas pelo mundo corporativo, onde os seus ensinamentospregam a prática da calma, da tranquilidade, da meditação-zen, enfim, da moderação, em tudo o que fizermos, o que caiu como uma luva para a Ambev que, após o epicentro da pandemia, procurava, agora, ancorar-se em um parceiro que pudesse levar todo esse significado para os seus consumidores. Esse parceiro, ou melhor, parceira, não poderia ser outra, senão a Monja Coen, que, ao associar-se a Ambev, com esse propósito, tornou-se embaixadora da marca para todo o Brasil, onde participará de eventos, internos e externos, promovidos pela companhia, inclusive lançamentos de produtos, sempre pregando seu propósito de vida: moderação.
Errou a Monja Coen, quando aceitou esse convite? Ao meu ver, fez um golaço, uma vez que ela tem intenções de construir um centro budista com seu próprio nome, em São Paulo, e sabia que nem juntando pelo resto da vida tudo o que ganha com suas palestras e a venda dos seus livros, jamais conseguiria concretizar esse sonho. De forma que, patrocinada pela Ambev, sua palavra chegará a um número cada vez maior de pessoas, e a Ambev conseguirá o seu objetivo de continuar incentivando seus consumidores a tomarem sua cervejinha,sem contudo, entretanto, todavia, precisarem encher a cara com ela, perder a direção do carro, do emprego ou até de casa. Muitos me acham ingênua por acreditar em capitalismo do bem. Pois eu acredito, acho totalmente possível, e só tenho que aplaudir a Monja Coen e a Ambev pela brilhante sacada.
(*)Marisa Sevilha Rodrigues é CEO da Taxi Blue Comunicação Estratégica e Publisher do Portal Boi a Pasto. Especialista em marketing digital e de serviços, é formada em Letras pela Unesp de Assis (SP) e em Comunicação Social, com ênfase em Jornalismo pela Fundação Educacional Cásper Líbero.